22 de set. de 2015

Paz pra mim é isso

O espetáculo que é ver o seu amor dormindo

E os primeiros raios de luz do dia que entram pelas frestas da janela de madeira já não incomodam quando você está ao lado. Porque é você quem está ao lado. Você, que geralmente dorme à minha esquerda, hemisfério corporal onde, dizem os especialistas, mora o coração. E então, por um momento, tudo parece fazer sentido. Foi essa a sua mandinga pra entrar no meu coração e pra, de quebra, tomar conta da minha cabeça e transbordar a minha vida. Não adianta negar. Foi essa a tática infalível pra que eu abrisse a porta da minha casa, o fecho do meu sutiã e incontáveis sorrisos de mais de oito graus na escala Richter.

Te olho dormindo. De bruços, os braços estendidos para cima e o rosto levemente virado para o lado. A respiração calma e silenciosa, como se você descansasse numa daquelas paisagens bonitas que a gente só vê em filme. As costas discretamente torneadas, como se cada músculo não fosse fruto de mais do que um esforço cotidiano. A boca perfeitamente cerrada, como se aqueles lábios grudados guardassem o segredo da criação do mundo. E é inevitável eu me perguntar como cabe tanta beleza num corpo tão pequeno. Tão compacto, tão discreto, tão sutil. Tão branquinho. Tão diferente do meu, todo desenhado e que nunca entendeu direito aquele tal de “menos é mais”. Tão menos e que consegue ser tão mais. Você, meu amor, saiu de uma pintura renascentista. Só pode ser isso. Você fugiu do teto da capela Cistina direto para os meus lençóis. Ciao, Michelangelo.

Porque aqui a vida é mais feliz. Tem travesseiro macio, embora você o dispense todas as noites. Tem cobertor, embora o meu calor lhe seja mais convidativo. E tem o meu corpo quente – ah, esse você não troca por nada. Só por uns minutinhos de sono a mais quando é ainda dia de semana. E sabe que eu até gosto? Porque nada me recompõe tão bem quanto saber que você está em paz. Que nenhum pesadelo feriu sua madrugada. Que os monstros que, um dia, talvez, tenham dormido embaixo da sua cama, foram embora pra nunca mais. Que o universo conspira a favor de nós. E que eu passaria noites inteiras velando o seu sono.

Eu, então, me aproximo para deixar um beijo no seu rosto inerte. (...) E eu fico pensando que nunca, jamé, nem never more eu conseguiria ser rude ou pouco doce na hora de te resgatar das profundezas do seu sono, que é sempre justo e bonito. Assim como você. E quando aquele raio de sol do meio-dia queima a sua retina por através das suas pálpebras, eu morro um pouquinho. Pra quê acabar com um dos espetáculos mais bonitos do planeta Terra, caro sol? Mas renasço ainda mais feliz assim que você me lança aquele primeiro olhar do dia, seguido de um sorriso, de uma carícia quase que infantil e de um preguiçoso beijo na boca, me chamando pra uma sacanagenzinha matinal e anunciando que, independentemente do que o Climatempo disser, o dia de hoje será mais bonito. Só porque você acordou ao meu lado.

Não sei pra vocês, meus amigos. Mas paz, pra mim, é isso.

By Bruna Grotti

13 de set. de 2015

Se você soubesse / Se eu soubesse.

O luto é lento. O homem pode disfarçar transando, separando o sexo do arrebatamento, tentando se relacionar à força, saindo com os amigos, aparecendo em festas, mas o luto é lento. 
Se você soubesse como é difícil o homem amar, como é raro o homem amar. 
O quanto é difícil. O quanto não será fácil acontecer outra vez.
Amor é desde o primeiro encontro, chuta a porta, arrebenta o trinco, esculhamba a vida.
Amor não é convencimento, persuasão, escolha do que é perfeito, do que se encaixa com o nosso temperamento.
Amor não é compatibilidade, afinidades eletivas, prazer da companhia. 
É o improvável, é o inesperado, é o desconhecido. 
É um mistério absurdamente desafiador, ingrato e perigoso
Vai além da amizade, do controle, do domínio, do interesse.
Amor é ser incompetente para compreender. É se despedir beijando, é se despedir indicando o contrário.
E muitas vezes se afastar não é se despedir - é apenas sofrer, agora sozinho, a falta de entendimento
Se você soubesse o quanto é complicado para o homem se abrir para alguém, atingir a cumplicidade e a confidência.
Homem não fala tudo para os amigos, homem fala o que pode. Mas o homem fala tudo para a mulher que ama, fala o que não imaginava falar um dia. 
A palavra é a última reserva masculina, a última guarida. Ele somente se confessa na intimidade.
Ao se separar, o homem perde a palavra. Talvez queira compensar com atos e bravatas, porém perde a palavra. 
Pode se vingar com o sexo, só que não é ele, não há brilho contumaz em seus olhos, não há a façanha da esperança, não há insegurança que o deixa seguro do que sente. 
Se você soubesse a exclusividade do amor masculino. A adoração do amor masculino. A loucura do amor masculino. A insistência secreta do amor masculino. 
Se você soubesse que jamais será substituída, trocada, apagada.
Que talvez ele nunca diga isso porque vão brigar antes. 
Talvez ele nunca agradeça o que recebeu ou o que ofereceu porque não terá oportunidade ou se calará diante de sua descrença. Você já não confia nele. Você é feita do extremo, da renúncia, como toda mulher: ou é ou não é, ou mente ou conta a verdade, ou demonstra ou está fingindo.
Não é assim que funciona para o homem. Homem é confuso, é incoerente, ele é mentira e verdade junto, brincadeira e seriedade misturadas, não tem como discernir. 
Se você soubesse.
Ele acordará bem num dia, mal num outro, vai cercar o coração com a razão, e seguir adiante. 
Seguir adiante não é superar, é se acostumar com a dor. 
Não confie na aparência feliz, o pássaro que canta pode estar chorando.
O luto demora, pois não existe para ele, que continua casado por dentro. 
Se você soubesse o quanto ele te ama.
E melhor ainda se você acreditasse.

Fabrício Carpinejar




Algum dos meus (muitos) leitores pode dizer se isso procede?
Agradecida

Beijos da Amy