Você é uma artista da fome? Eu não era, mas me tornei. Explico, sim.
“Um artista da fome” é um conto de Franz Kafka com mil desdobramentos. Mas vamos nos ater apenas a toscas pinceladas: ele expõe a história de um jejuador profissional, uma atração de circo, que um dia, mesmo sem precisar manter seu jejum, o mantém e morre. Suas últimas palavras são sobre por que passou a vida inteira jejuando: “Eu não pude encontrar o alimento que me agrada. Se eu tivesse encontrado, pode acreditar, não teria feito nenhum alarde e me empanturrado como você e todo mundo.”
Antes eu não era uma artista da fome, eu não jejuava: me virava com o que tinha, com o que dava, com o que parecia possível, com o que talvez me alimentasse. Talvez foi meu pão e vinho, (...), por muito tempo.
Então, a cada grão de areia a menos na ampulheta, sem premeditar, sem sequer desejar, eu fui me tornando uma artista da fome: não consigo me empanturrar como todo mundo (quem se empanturra não saboreia) e até mesmo esses nacos de carne que me garantiam alguma sobrevivência se tornaram intragáveis.
Nunca encontrei um alimento que me saciasse e é por isso que me tornei uma retirante emocional. Eu sempre vou embora – às vezes eles vão antes. Afinal, eu não quero um milhão de coisas, só quero aquela coisa especial: amor. No amor cabe tudo. E é de tudo, portanto, que eu tenho fome.
Adaptado - Stella Florence
Nenhum comentário:
Postar um comentário